“O amor! Nada mais belo, nada mais trágico, nada mais enigmático”.
Assim começa o recém-publicado livro do psicanalista doutor Matthias Ammann —
“Antes, Durante, Depois do Amor”. E foi justamente sobre o enigma do amor que tivemos a oportunidade de conversar com o autor da obra, por e-mail.
O amor exige flexibilidade e uma abertura ao desconhecido
Nascido na Suíça, ainda criança Mathias Ammann veio com os pais para o Brasil, se estabelecendo em Nova Friburgo, onde viveu 20 anos, e estudou no Externato Santa Ignez. “Meus pais são suíços, vivem em Friburgo, e estão no Brasil faz uns 40 anos. São proprietários do Auberge Suisse, em Amparo”, conta.
Formado bacharel e mestre, trabalhou por cinco anos como pesquisador no Ministério da Educação. Em 2013, mudou-se para Portugal onde fez doutorado em Estudos Culturais (Universidade do Minho) e aprofundou sua formação em psicanálise na Associação Portuguesa de Psicanálise e Psicoterapia Psicanalítica (APPPP).
Hoje, se dedica à “escuta dos afetos e das emoções, interessado que é pelo humano em sua pluralidade”. Tem um livro publicado sobre narcisismo —
Narciso, o arquiteto do vazio —, e diversos artigos em revistas especializadas.
Como psicoterapeuta psicanalítico, atende adultos e jovens, on-line e presencialmente, em tratamentos de ansiedade, depressão, conflitos emocionais e crises existenciais, e na busca de autoconhecimento. Sua prática integra psicanálise, psicoterapia e psicologia contemporânea, “sempre respeitando a singularidade de cada pessoa”.
Gostaria que explicasse como foi falar sobre amor, escrever sobre “conceitos sagrados”, considerando sua formação como psicanalista.
Eis uma boa questão! Penso que o primeiro ponto importante é exatamente retirar o amor do lugar de sagrado. O amor é considerado sagrado porque, em certa medida, não se fala com seriedade sobre o amor. Para algumas pessoas é algo íntimo ou privado; para outras, é visto como algo vegonhoso, vexatório ou ridículo de se refletir. E ainda há aqueles que acreditam que amar é algo simplesmente natural. Infelizmente, essa aura de secretismo alimenta idealizações e encobre ideologias que perpetuam preconceitos, muitas vezes gerando sofrimento. Se pudéssemos falar sobre o amor com mais seriedade e atenção, acredito que haveria menos “fome afetiva”, menos ignorância relacional, mais possibilidades de convivência genuína e menos desamparo. Diante desse diagnóstico, dediquei algum esforço para que pudéssemos conversar de forma mais aberta sobre o amor.
Quanto de psicanálise há na escrita de “Antes, Durante, Depois do Amor”?
Na minha escrita, sempre há um pouco de psicanálise. A psicanálise, entre outras coisas, é a arte de escutar e de falar. Nesse sentido, ouvir o sofrimento, as expectativas e o desamparo no consultório ajudou-me a entender a urgência do tema. No entanto, eu pessoalmente vejo a psicanálise como parte de um conjunto maior de disciplinas. Acredito que a transdisciplinaridade é essencial para compreendermos o mundo. Conciliar a psicanálise com a sociologia, a filosofia e algumas reflexões estéticas pareceu-me ser um bom caminho — caminho esse que segui no atual livro.
Como escreveria o “Antes…” se tivesse outra formação? Como acha que seria?
Certamente, há muitas formas e caminhos para se falar sobre o amor, e todas elas são válidas. No entanto, acho importante mantermos um olhar crítico. A crítica nos permite questionar e desconstruir verdades absolutas, como, por exemplo, o ideal romântico que nos foi contrabandeado por filmes e séries. Sem esse olhar crítico, corremos o risco de apenas reproduzir preconceitos, ideologias e relações de poder naturalizadas.
No caso do amor, ou mesmo ao falar sobre ele, não é diferente. Porém, sou da opinião que mais áreas deveriam se envolver nessa discussão. Áreas como o direito, as mídias digitais, a culinária, a estética, entre outras, pois assim ganharíamos mais perspectivas. Eu, infelizmente, só consigo falar do meu lugar.
Mais especificamente sobre o seu processo da escrita dessa obra, como foi desenvolver o tema, quanto tempo levou escrevendo?
O processo da escrita, perdoe-me pela redundância, é, de fato, um processo. Algo que demanda investigação, inspiração e bastante esforço. Sempre que inicio um novo projeto, busco conciliar um pouco de coragem, estrutura, errância e uma abertura ao acaso. No caso deste livro, não foi diferente. Felizmente, há
muitos bons livros sobre o tema que já foram escritos, e alguns deles utilizei como referência para o manuscrito. No entanto, sempre procuro deixar algum espaço para o surgimento do imprevisto, do novo. Para este livro específico, a única coisa que soube de início foi que queria escrever sobre três momentos importantes: o antes, o durante e o depois do amor. Com essa estrutura em mente, após um ano e alguns meses de trabalho, o livro ganhou sua primeira versão.
Vagando entre a psicanálise e o amor, respostas únicas, ou, digamos, conclusivas, são possíveis?
Se houvesse uma resposta única, penso que ela seria justamente a de que não há respostas únicas. Evidentemente, ler sobre o amor, falar com seriedade sobre ele, aprender, fazer terapia, entre outras coisas, pode ser útil. No entanto, parece-me que o amor exige flexibilidade e uma abertura ao desconhecido, ao grande enigma — um lugar que dificilmente se deixa prender em uma receita de bolo ou em uma resposta definitiva.
Como ainda não tivemos a oportunidade de ler o livro — visto que ele será lançado neste sábado, 14, gostaria de saber qual a sua expectativa com “Antes, Durante, Depois do Amor”. É um ensaio, um romance, um estudo, podemos/devemos colocá-lo em que gênero literário?
A minha expectativa é que se fale mais sobre o amor. Penso que já conseguimos isso aqui, estamos conversando sobre o amor. Quanto ao gênero literário, busquei criar algo leve, mas com uma boa fundamentação teórica. Uma introdução para aqueles que querem explorar o tema em maior profundidade,
um convite para pensar o amor de diversas maneiras.
Para encerrar, a psicanálise ensina alguma coisa sobre o amor?
Acho que a psicanálise — ou, mais especificamente, a psicanálise em que eu acredito — ensina que nos devemos libertar do ocultismo, do secretismo e dos absolutismos. O amor também carrega os seus “ismos” e ao nos libertamos deles, abrimos espaço para que algo singular e autêntico possa surgir.
Serviço
- “Antes, Durante, Depois do Amor”
- Lançamento: 14 de junho, 14h,
- na Flaneur, no Porto, Portugal
Disponível na editora carioca Confraria do Vento: https://www.confrariadovento.com/editora/catalogo/item/350-antes-durante-depois-do-amor.html )
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